Tempos difíceis, os atuais, não? Estamos escrevendo uma
página assustadora da nossa história. A sociedade brasileira esta
protagonizando um dantesco espetáculo de intolerância, ódio e preconceito que
se alastra país afora - e rede social adentro - feito rastilho de pólvora. E o
grande catalisador destas ações e reações despropositadas é aquilo que de mais
rico e bonito possui o ser humano: as suas diferenças.
Aquilo que faz do ser social, um ser único, do ser coletivo,
um ser individual, está pondo-nos em guerra com nós mesmos. A sociedade
neofascista que estamos construindo nos está colocando em violento antagonismo
com tudo aquilo que não somos nós, com o outro, com o alheio, com o diferente,
em síntese. O confronto é de pessoas, não mais de ideias, opiniões ou pontos de
vista. Então, o diferente é declarado inimigo mortal.
E o patológico deste comportamento é as pessoas acreditarem piamente
que o diferente não é apenas diferente, é inferior, e, em assim o sendo, merece
o meu desprezo, a minha repulsa e até mesmo o meu mais feroz ataque – o
fascismo na mais pura essência. Esse comportamento doentio, cuja natureza remete-nos
às mais delirantes aspirações hitlerianas, põe em pé de guerra brancos e
negros, ricos e pobres, magros e gordos, homos e heteros, mulheres e homens,
nortistas e sulistas, estrangeiros e nativos, conservadores e progressistas,
católicos e protestantes, cegando-nos para o mais importante: somos todos da
mesma raça, a raça humana.
E qual seria a causa deste comportamento que se alastra com a
desenvoltura de uma epidemia? Lamentavelmente, eu também não tenho a resposta,
mas desconfio de que ele tenha relação direta com um sentimento que é
devastador para a alma humana: o sentimento de inferioridade. Talvez a fúria
com que o racista, o homofóbico, e o xenófobo agridem o que se lhes apresenta diferente
não seja mais do que uma tentativa desesperada de esquivar-se de uma condição –
irreal, diga-se – de inferioridade que a própria sociedade lhe impôs. E o
parâmetro de distinção sempre é o outro, supostamente num patamar mais baixo,
crê o agressor. Se sou branco, meu parâmetro de distinção é o negro, e eu o
inferiorizo para que a cor da minha pele denote a supremacia da minha raça.
Mas, ao mesmo tempo em que sou branco, sou pobre, então a pequena burguesia me humilha
e me rechaça, não sem ser, ela mesma, fustigada pelo aristocrata, que, por sua
vez, é homossexual e igualmente sofre na carne os efeitos do preconceito,
embora o pratique também no afã de libertar-se de um sentimento de
inferioridade que o deteriora.
Curiosamente, aqueles que não suportam o diferente,
reverenciam a diferença, que, em suma, é o artifício que os faz sentirem-se
superiores. Portanto, se o diferente provoca-me ojeriza, a diferença é-me cara,
pois é ela é o álibi perfeito para ódio que dedico ao outro. O fetiche reside
em cultivar as diferenças, perpetuá-las e exaltá-las ao grau máximo, para que o
parâmetro de distinção perdure e siga avalizando condutas arrogantes,
truculentas e até mesmo violentas contra os seres humanos supostamente
inferiores por sua condição social, étnica, sexual, política, religiosa, etc. Uma
simples ameaça de igualdade petrifica quem se vale das diferenças para
arrogar-se superior.
Oxalá, num futuro próximo, saibamos conviver com as
diferenças e compreendamos que são elas a força motriz do universo. Sem as
diferenças, não há movimento, e sem movimento, não há vida.
Sei lá se meu devaneio faz algum sentido ou é apenas aquilo a
que se propôs ser, um devaneio. Mas, por ora, penso por aí. Quiçá, amanhã,
mudarei de ideia. Minhas opiniões e impressões não são cláusulas pétreas,
graças a deus! Não chego a ser uma metamorfose ambulante, mas não tenho medo de
mudar meu ponto de vista, se me convém.
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